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VASOESPASMO

Vasoespasmo Cerebral

O vasoespasmo é o estreitamento (diminuição de calibre) difuso ou focal das grandes artérias cerebrais, em geral secundário a HSA.  Afeta as artérias intradurais no espaço sub aracnóide, principalmente o segmento distal das carótidas internas ACI), artéria basilar e segmento proximal dos grandes ramos da base do crânio, podendo se estender para ramos secundários e terciários(19).

Ocorre em consequência da presença do sangue no espaço sub aracnóide da base do crânio e da ação dos produtos de sua degradação.

O vasoespasmo é na grande maioria das vezes decorrente da HSA secundária a ruptura de aneurisma cerebral. Outras causas de HSA que podem levar ao mesmo quadro incluem sangramento de uma malformação arteriovenosa, vasculite, síndrome da vasoconstricção reversível e trauma.

 

Incidência:

Em casos de ruptura de aneurisma, geralmente não ocorre antes dos 2 dias da HSA e tem pico de incidência entre o 5° e 8° dias.  Pode ocorrer do 4° ao 14° dia, sendo raro após este período.

Aproximadamente 70% dos pacientes irão desenvolver vasoespasmo angiográfico na segunda semana após HSA e irão se tornar sintomático em cerca de 30 a 40% dos pacientes, dos quais 20 a 30% desenvolverão sequelas graves ou irão a óbito(19).

O pico de incidência de sintomas devidos a isquemia é nos dias 7 e 8 da HSA, ou 1 a 2 dias após o pico de espasmo angiográfico sendo um dos principais fatores de morbimortalidade na HSA.

A incidência e intensidade do vasoespasmo estão, na maioria das vezes, relacionadas à quantidade de sangue no espaço sub aracnóide, sendo em geral mais intenso onde existe maior quantidade de sangue; porém não é sempre uma relação de causa-efeito.  Pacientes com grande quantidade de sangue podem não ter vasoespasmo e outros com pouco podem tê-lo de maneira severa.

 

Fisiopatologia:

Uma cascata de eventos leva ao desenvolvimento do vasoespasmo devido ao espessamento de todas as suas camadas. Os produtos de degradação da hemoglobina no espaço subaracnóide desencadeia a contração da musculatura lisa da túnica média.  Ocorre também a aderência de coágulos na adventícia levando a infiltração de células inflamatórias e degeneração nervosa perivascular perivascular e pode ocorrer espessamento da íntima por edema, descamação e perda das junções intercelulares. A proliferação intimal pode ocorrer mais tardiamente.

Com o aumento na intensidade do vasoespasmo, o mecanismo de compensação vai se esgotando e na ausência de circulação colateral adequada (mais frequentemente ocorrendo no espasmo difuso), irá se desenvolver um quadro de isquemia cerebral, tornando-se o vasoespasmo clínico.  Como outros fenômenos já citados estão agindo concomitantemente, o diagnóstico do vasoespasmo clínico pode ser difícil.  O rebaixamento do nível de consciência (sonolência, torpor ou coma) pode ser devido a HIC, hiponatremia ou hidrocefalia(8).

 

Diagnóstico:

Déficit neurológico focal é um sinal mais fidedigno de relação ao vasoespasmo setorial, principalmente se houver correlação com maior quantidade de sangue na tomografia computadorizada (TC) no território vascular correspondente.

Em geral, existe aumento da cefaleia e dos sinais de irritação meníngea, febrícula, hipertensão arterial e taquicardia precedendo o vasoespasmo clínico. Sonolência, torpor e confusão são outros sinais, porém não específicos.

Monitoramento com Doppler transcraniano (DTC) diário ou várias vezes ao dia no período de pico do vasoespasmo é bastante útil em avaliar a evolução da velocidade do sangue na artéria cerebral média (vaso de mais fácil acesso ao DTC e de maior importância no vasoespasmo) vai acusar o vasoespasmo como causa de manifestações clínicas quando houver coincidência da instalação destas com um aumento da velocidade.

Além de um aumento progressivo da velocidade na artéria cerebral média (ACM), um aumento no índice ACM/ACI (índice de Lindegaard) é útil para diagnosticar vasoespasmo. A velocidade normal do sangue na ACM é abaixo de 60 cm/seg. Velocidade maior de 120 cm/seg. indica vasoespasmo e acima de 200 cm/seg. está comumente associada com vasoespasmo sintomático e isquemia cerebral.  Outros fatores, no entanto podem aumentar o fluxo na ACM e é importante ter um parâmetro para cada paciente e avaliar ao menos uma vez por dia a evolução durante o período de ocorrência do vasoespasmo. Um aumento do fluxo pode preceder vasoespasmo sintomático.  Aumento rápido e precoce no fluxo, de mais de 50 cm/seg./dia é bastante sugestivo de instalação eminente de vasoespasmo clínico e o mesmo pode ser tratado assim que instalado(2).

Dependendo do estado clínico do paciente, as medidas de suporte podem incluir sedação, entubação oro traqueal e uso de vasodilatador, incluindo fenobarbitais, o que dificulta a avaliação clínica (pacientes grau 4 e 5 de Hunt & Hess), impedindo a determinação exata do momento de instalação do vasoespasmo clínico, tornando o Doppler transcraniano bastante útil (Tabela 9).

Tabela 9. Critérios para indicar tratamento endovascular em pacientes entubados e sedados.

                                                Doppler Transcraniano

Aumento de 50 cm/s em 24h

Duplicação da velocidade em 24h

Velocidade > 200 cm/s

 

Tratamento Endovascular do vasoespasmo:

Quando as medidas clínicas de tratamento do vasoespasmo falham e este se torna sintomático, está indicado um tratamento mais agressivo, que pode ser feito por via endovascular, não existindo outras medidas disponíveis(19).

Uma das principais medidas de tratamento clínico é o aumento da pressão arterial para vencer a barreira da vasoconstrição, porém seu uso é arriscado quando o aneurisma não foi ainda tratado.  Por isso, é imprescindível o tratamento precoce do aneurisma, ou então seu tratamento junto com o TEV do vasoespasmo clínico.

O tratamento deve ser feito o mais rapidamente possível após o início dos sintomas (e em vigência de todo o tratamento clínico), para reverter prontamente a situação de isquemia cerebral, antes que haja dano cerebral irreversível e também para diminuir o aumento da área de isquemia.

Como regra geral, o aneurisma deve ser tratado primeiro, se possível.  Caso não se tenha acesso ao mesmo, usamos pequena dose de papaverina ou outro vasodilatador para que se possa acessá-lo. Depois do tratamento do aneurisma é feita a angioplastia dos vasos proximais (ACI distal, Basilar ou segmentos M1, A1 ou P1).  Se houver vasoespasmo distal, adicionamos vasodilatadores(19).

Basicamente, o TEV será químico e/ou mecânico (Figura 10).

 

Angioplastia Mecânica:

O tratamento mecânico, com angioplastia, é feito usando-se microcateteres com balões especialmente desenhados para este fim e também aqueles usados para remodelagem e reconstrução do colo do aneurisma.  São balões bastante maleáveis, assumindo diâmetros diferentes quando inflados gentilmente.  Não suportam grande pressão, porém devem ser dimensionados ao calibre do vaso. Balões de angioplastia, que se inflam a altas pressões (6 a 10 ou mais atmosferas) não devem ser usados por risco de ruptura do vaso e serem menos flexíveis para uso intracraniano.

O balão é introduzido sobre um microguia, que irá direcioná-lo ao local desejado. Cuidados devem ser tomados para evitar perfuração de pequenos vasos.  O avanço do microguia deve ser lento e sem se fazer muita força para ele avançar, para evitar danos ao vaso já bastante alterado pelo vasoespasmo.

Em geral, a angioplastia é feita com segurança na carótida interna, basilar e segmento M1, por serem mais calibrosos.  Existem balões pequenos, de até 1,5mm de diâmetro, porém seu uso distal, em M2, por exemplo, deve ser feito quando se tem certeza do calibre original do vaso com angiografia antes do surgimento do vasoespasmo, para evitar ruptura de pequeno vaso.

O balão deve ser inflado e desinflado de maneira progressiva, até atingir o diâmetro do vaso, fazendo uma dilatação progressiva.

Esta técnica tem alguns riscos, como ruptura do vaso ou tromboembolismo e deve, portanto ser usada somente no território vascular que está apresentando sintomas, mesmo que outros territórios também estejam acometidos.

A angioplastia é bastante eficiente em produzir uma dilatação permanente do segmento estenosado do vaso, raramente necessitando ser repetida.  Ela produz um rompimento do tecido conectivo proliferado pelo vasoespasmo.

A angioplastia foi eficiente em restaurar o calibre do vaso na maioria das séries publicadas acima de 95% dos casos, embora não haja melhora clínica na mesma proporção, por diversos fatores, como idade dos pacientes, tempo entre o início dos sintomas e o tratamento, gravidade do quadro clínico, vasoespasmo difuso e presença de outras comorbidades.

Como a angioplastia é aplicada somente aos vasos proximais, quando há espasmo distal, podemos associar o tratamento químico com papaverina ou outra droga, para obter melhores resultados, como é feito na maioria dos trabalhos publicados.

 

Angioplastia Química:

A angioplastia química pode ser realizada com a infusão intra-arterial de vasodilatadores. Estes podem ser infundidos nas carótidas internas ou vertebrais cervicais ou em topografia intracraniana através de microcateteres.

Os bloqueadores dos canais de cálcio são os agentes mais utilizados devido ao excelente perfil de segurança e eficácia. Eles agem principalmente pela inibição dos canais de cálcio das células musculares lisas, mas também há evidências de efeitos neuroprotetores indiretos.

As drogas mais utilizadas para o tratamento do vasoespasmo são (Tabela 10):

·      Papaverina

·      Verapamil

·      Nicardipina

·      Nimodipina

·      Milrirone

A droga vasodilatora mais usada intra arterialmente para tratamento do vasoespasmo é a Papaverina.  Seu efeito é potente, porém fugaz, desaparecendo em poucas horas. A meia vida da Papaverina é de 0,8 horas. O Verapamil tem um tempo de meia vida de 7h, a Nimodipina de 9 h e a Nicardipina de 16h. A Milrirone também tem sido utilizada como alternativa para o tratamento do vasoespasmo(35).

Tabela 10. Principais medicações utilizadas para o tratamento intra arterial do vasoespasmo cerebral.

DrogaDose MáximaDiluição com SF0,9%EficáciaTempo TotalMeia-VidaEfeitos Adversos
Nimodipina10 mg25%+++++90 min9hHipotensão
Verapamil40 mg25%++++20 min6hDepressão Miocárdica, Bradicardia
Nicardipina10 mg25%+++++10 min26hHipotensão, Bradicardia
Milrirone15 mg25%+++++60 min9hHipertersão

 

A pressão arterial deve ser cuidadosamente avaliada. Caso ocorra uma variação de 15 mmHg a injeção do vasodilatador deve ser interrompida até a pressão retornar a linha de base.

Após a infusão, controle de angiografia deve ser realizada para avaliar a resposta ao tratamento.